-Boa tarde, senhor Manuel!
Alimentando a terra, senhor Manuel?
-Boa tarde, senhora professora! Como vai a senhora?
-Muito bem, graças a Deus! Muito obrigada!
-O senhor, depressa esqueceu o dia de ontem! Já de manga curta, todo suado… mas eu sei que para trazer esse estrume para o terreno, muito já puxaram seus braços!...
-É verdade professora! Logo pela manhã, tive que o arrancar do curral e olhe que o trouxe para aqui, naquele carrito de mão! Cada montinho foi uma carrada, agora veja as vezes que eu tive que ir até ao curral e vir!...Mas tem que ser, para se por o pão na mesa. Vamos lá ver …vamos lá ver como chega abril, porque
“inverno de março e seca de abril deixam o lavrador a pedir”.
E o março, como a senhora vê tem sido muito invernoso.
Senti no senhor Manuel, uma certa vaidade e bem merecida essa vaidade, quando me começou a revelar tudo que o tempo lhe ensinou.
Trabalhar as terras exige conhecimentos que se adquirem com as luas.
O senhor Manuel sabia ler as estrelas, o sol, o vento, as nuvens, o alvoroçar dos passarinhos e até o seu chilrear.
-Sabe, professora, as terras já deviam estar lavradas e estrumadas. Estamos no fim de março, e no ano passado já tinha semeado muitas batatas. Mas, o março chuvoso não me deixou. Verdade, que estava tudo seco, mas choveu este mês quase tanto como em dois ou três meses juntos…tenho lá cima uma leirita com umas batatas do cedo, vamos lá ver como elas vêm! Semeei-as no fim de fevereiro, tem as suas vantagens, sabe!..., Semear no cedo, poupa-se muito na rega, pois em “abril águas mil” e as batatas vêm com a rega do céu…e mais, não são tão atacadas às pragas…tenho tido anos que a terrível traça me destrói um campo de batatas…basta o verão ser muito quente e a maldita aparece da noite para o dia… No tempo frio a traça não se vê…não gosta do frio…Como vê semear no cedo tem as suas vantagens!
-As vantagens é o senhor, poder comer umas batatinhas novas lá para maio…e que bem lhe vão saber!
-Se vão…se vão…com umas ervilhinhas, uma posta de bacalhau e um ovo, pois as minhas galinhas são poedeiras….tudo regado com o meu azeite que fiz no lagar de Arcas…ó senhora professora, aquilo é um manjar!...
-Estou para aqui a roubar seu precioso tempo, senhor Manuel…
-Os dias, já são um pouco maiores, professora, agora com a mudança da hora já se vai mais tarde para casa…
vou-me, então, espalhar o estrume, amanhar bem a terra…para amanhã ser semeada…
depois vai ver como ela parece uma toalha de uma mesa de um rei…
abril está à porta...
aguardamos a sua chegada, mas nunca é de confiar!
Abril, ora chora, ora ri...vamos ver o que Deus nos reserva!..
A vida no campo tem seus segredos…sua beleza… que me prendem ao chão, quando encontro alguém que sabe ler as estrelas, o sol, o vento…
Celeste Almeida, a autora do texto