Há dias, sentada em frente à minha secretária, tentava escrever um miniconto de Natal para participar numa Antologia, a convite de uma Editora.
Muito pouco inspirada, não havia maneira de me surgir uma ideia que me enchesse as medidas para dar resposta ao desafio, decidindo rebuscar nas minhas memórias de criança, alguma história em que me pudesse inspirar para dar início ao texto.
Recordei, então, uma curta narrativa que alguém me contara quando eu era criança, embora não lembre exatamente quem ou o real conteúdo da mesma. Apenas me lembro de que o título do Conto.
Era:
A Menina Rica e a Menina Pobre, a retratar os caprichos de uma criança muito prepotente e mal-educada.
Aí, decidi reinventá-la e reescrevê-la à minha maneira. Espero não defraudar as expetativas dos leitores e que gostem desta minha versão. …
Na aldeia de Joana havia um casal abastado que tinha uma filha muito birrenta. Rita era o seu nome. Tudo o que via queria. Os pais nunca lhe diziam ‘não’ e ela crescia egocêntrica e mal-educada, julgando-se dona do mundo.
O mês de dezembro aproximava-se e os progenitores perguntaram-lhe que presente desejava receber do Pai Natal? Rita pensou, mas nada havia de novo que lhe interessasse. Já tudo a entediava.
Um dia, chegou à povoação uma menina da mesma idade.
Era linda, de olhos azuis, translúcidos, pele clara e cabelos loiros, resplandecentes como o Sol. E tinha o nome de uma flor... Margarida!
Seus pais eram pessoas muito dignas, mas extremamente pobres.
Margarida não frequentava o ensino porque tinha necessidades especiais. Isso entristecia o seu belo semblante, pois queria muito aprender a ler e a escrever.
Rita invejava a beleza da novata, principalmente, os seus magníficos olhos azuis. Também era bonita com seus olhos castanhos, cabelos negros e pele morena, mas era o oposto de Margarida que demonstrava uma personalidade, dócil, tranquila e educada.
Rita era interesseira, arrogante e burra. Do alto da sua prepotência, gritava para os progenitores que se Margarida, sendo tão pobre, podia ter olhos azuis, por que é que ela, sendo tão rica, não podia ter?
Os pais ficaram assustados com a sua intransigência. Sempre lhe davam tudo o que queria, mas desta vez, a garota ambicionava o impossível. Davam-se, agora, conta que tinham falhado na educação da sua menina.
Dali em diante, a vida tornara-se num inferno, com Rita sempre a birrar porque queria uns olhos azuis, iguais aos de Margarida.
Desesperados, não sabiam mais o que fazer para dissuadi-la de tão absurda exigência .
-Quero uns olhos azuis!
-Quero! Quero e pronto!
Certo dia, Margarida passeava com a mãe junto à mansão dos pais de Rita, quando ouviram a garota gritar que queria ter olhos azuis como os da menina pobre.
Ao escutar tal requisito, Margarida perguntou se podia entrar para conversar um pouco com ela. Talvez a pudesse acalmar.
A dona da casa consentiu e agradeceu.
Apoiada no braço de sua mãe, Margarida entrou e encarou Rita de frente, o olhar fixo no infinito, deixando-a ainda mais fascinada com a beleza do seu olhar.
Margarida perguntou-lhe por que é que queria tanto ter uns olhos como os dela?
Rita argumentou:
- Se tu, que és tão pobre, tens olhos azuis, por que é que eu, sendo rica, não posso ter?
Margarida não acreditava no que ouvia.
Aqueles pais haviam inculcado na filha a ideia de que o dinheiro tudo podia comprar. Pobre criança, ignorante e caprichosa!
- Rita, não queiras uns olhos como os meus, só porque são azuis!
Aceita e agradece a Deus a cor dos teus, pois permitem-te apreciar as coisas belas do mundo.
Os meus são azuis e lindos, tu o dizes porque os vês e admiras com os teus castanhos, enquanto eu… jamais os vi ou verei.
Sou cega!
Nada vejo!
Nada tenho!
Ainda assim, sou grata e feliz.
Aceita-te como és! Por mais riqueza que obtenhas, nunca serás ninguém além de ti mesma .
Rita estava envergonhada. Sem nada dizer, fechou-se no quarto, ajoelhou-se e pediu perdão por ser tão má e fútil. Depois, pegou num lápis e numa folha de papel e escreveu:
Querido Pai Natal, este ano quero de presente tratamentos e exames às vistas de Margarida. Espero, sinceramente, que um dia possa apreciar com seus lindos olhos azuis as maravilhas que sempre proporcionaste aos meus.
Dulci Ferreira, a autora do texto