18 Mar
18Mar

Quis alcançar o céu com asas de bronze e sonhos de prata, em voos demorados que abraçassem o dia e se estendessem como fios de luz pelos portais da noite. 

Quis entrar sem convite nessa festa de silêncios dourados, e pousar tranquilamente entre os lençóis de papel preenchidos de letras, com poemas de versos rimados e canções de desfolhadas. 

Quis roubar de outras mãos a espiga de milho rei, para que só o meu beijo pousasse nos teus lábios, antes que o vento pronunciasse o teu nome e o fragmentasse em sílabas voláteis, perdidas no eco das montanhas.

Quis ser fruto doce nas tuas manhãs claras. O néctar açucarado de uma melodia suave, e a terna envolvência do perfume delicado das rosas vermelho-púrpura. Quis ser o salão onde os teus passos ganham vida, o tango da tua paixão, e deslizar os meus dedos nas cordas da nossa saudade.

Quis amar sem limites ao amanhecer, voar livremente e abraçar o Sol em fim de tarde e envolver, num abraço apertado, a Lua ao cair do crepúsculo.

Ao refugiar-me da vida em sonhos por mim inventados, descobri dor e lágrimas na força das palavras que atiraste ao vento, qual voz irada de anjo com asas e penas de puro aço! 

Como amar a frieza contundente dos dizeres que ferem e rasgam as expetativas? 

Apesar da mágoa que em mim se demora, ainda sonho escutar da tua boca, aquela vontade louca de a minha boca beijar.

De sentir o teu abraço os meus braços enlear.

De adormecer no teu colo e no bailado dos teus olhos me rever ao acordar. É sonho, eu sei, mas, por favor, não me impeças de sonhar! 

In Antologia “Três Quartos de Um Amor” – Chiado Books, 2025

Dulci Ferreira, a autora do texto

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