29 Aug
29Aug

Foi uma tarde mágica, esta que passei no seio das montanhas mágicas. Aninhada num vale profundo, entre as encostas íngremes da Serra de S. Macário, avistei a linda aldeia da Pena, com casinhas de xisto e cobertas de lousa.

Aldeia da Pena

Aventurar-me a descer, novamente, aquela estrada estreita que mais parece a enorme serpente que outrora obrigou as poucas pessoas que habitaram um outro lugar, a mudarem-se com muita PENA, para aquele vale, não fui capaz. O medo de encontrar outro carro foi maior que a minha coragem. 

Desta vez, sentada numa pedra, deixei-me envolver por aquele sossego, viajar no mundo lendário e imaginar 

"o morto que matou o vivo".  

Depois de contemplar aquele lugar remoto, subi a elevação, ornada com enormes afloramentos rochosos que mais parecem esculturas feitas por alguma divindade naturalística e cheguei ao Monte de S. Macário, denominado até ao século XII de " Monte Magaio".  

Chegada a este lugar quase virgem, senti-me num paraíso com uma paisagem de cortar a respiração. 

Nos vales encaixam-se várias aldeias e eu embalada por um baloiço majestoso, senti-me abraçada pela serra do "meu" Montemuro, serra do Caramulo e a serra da Estrela todas elas visíveis naquele horizonte fantástico.  

Este imponente lugar, bem no coração das Montanhas Mágicas, é povoado de mitos e lendas, sendo o ex libris a lenda de S. Macário, um eremita que se tornou Santo e Padroeiro desta serra.

São Macário

No cimo do monte, cheio de recantos mágicos, erguem-se duas ermidas, em homenagem ao santo: 

As Ermidas de São Macário de Cima e de São Macário de baixo

Ermida de S. Macário de Cima

Ermida de S. Macário de Baixo,

constituindo um dos mais singulares santuários de montanha. 

Mas, quem foi Macário e o porquê de ter em sua homenagem duas capelinhas?  

Diz a memória das gentes que Macário era filho de um homem muito rico, natural de Castela.  

Macário era considerado um boémio, tendo a caça como um dos prazeres que praticava amiudadamente, acompanhado pelo pai e pelos criados.  

Certo dia, apareceu um javali e foram todos em sua perseguição, pois a carne deste animal selvagem era um dos manjares na mesa nobre da família. 

Macário pega no arco e lança com fúria uma seta que foi direitinha ao peito do seu pai que apareceu, subitamente, vindo detrás de uma fraga.

Em poucos segundos o progenitor perdeu a vida. 

Macário, louco de dor, gritando desesperadamente, fugiu e nunca mais foi visto. 

Os amigos e os seus criados ainda o procuraram durante vários dias, mas acabaram por desistir, dizendo entre eles, que estaria morto num lugar qualquer. 

Cansado, com os pés a sangrar, as roupas todas rotas, as barbas crescidas, escolheu um lugar ermo de uma serra distante. Lá viveu como ermitão, enclausurado do mundo, à espera do perdão de Deus. 

Fez de uma gruta onde se escondiam os animais selvagens a sua casa.

Alimentava-se de raízes, frutos silvestres e gafanhotos, descendo algumas vezes às aldeias para pedir esmola e brasas para acender o lume entre as pedras. Não havia vivalma que não lhe enchesse o saco com pão e as brasas levava-as nas mãos sem se queimar. 

Certo dia, Macário regressava à sua gruta com as brasas e surgiu-lhe o demónio, encarnado numa linda rapariga que lhe sorriu.  

Sem resistir ao desejo, parou e a volúpia assombrou-lhe a paz de espírito.  

Nesse instante, as brasas queimaram-lhe as mãos e Macário sentiu-se arrependido dos maus pensamentos.  

Cheio de dor, começou a fazer penitência para remissão do pecado. Recolheu na mais profunda solidão, passou fome, alimentando o corpo e a alma com orações.  

O demónio ainda tentou atormentá-lo outras vezes, mas sem sucesso.

Macário o eremita muitos anos viveu no Monte Magaio. Morreu velhinho quando já todas as pessoas da região o chamavam de santo. 

Os anos passaram, mas a santidade do santo espalhou-se com os ventos fortes do monte. Atravessou montes e vales e chegou a muitos outros lugares.

Hoje, o Monte Magaio é chamado Serra de S Macário.

Para perpetuar e venerar a memória do santo, existem duas capelinhas.

Uma construida encostada à gruta onde viveu: o S. Macário de Baixo.

A outra, alguns metros mais acima a de S. Macário de Cima, protegida dos ventos fortes por um muro construído à sua volta.  

Os romeiros e os peregrinos ocorrem ao santuário todos os dias para rezarem ao santo, mas o dia mais venerado é o último domingo de Julho, dia da Festa em honra do S. Macário. 

O mundo lendário é muito rico. Deixou-nos um legado muito valioso que passa de geração em geração. 

Verdadeiras?  

Fruto da imaginação das pessoas?  

Talvez sejam ambas as coisas, mas uma coisa é certa: 

as lendas são narrativas transmitidas oralmente pelas pessoas, que explicam acontecimentos misteriosos, misturados com factos reais.

Narrativas que ao longo dos tempos se vão metamorfoseando. 

Assim se explica, a razão de existirem lendas diferentes contextualizando o mesmo assunto. 

Eu, própria, conheço outras lendas sobre o S. Macário bem diferentes desta.

Celeste Almeida, a autora do texto

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