15 Oct
15Oct

(cantando Walt Whitman) 

Subiu à montanha e cantou 

Um canto de si mesmo

Um sopro ao ouvido do seu chão

Um sussurro de partilha 

Um leito de rio fluindo nas suas entranhas. 


Cantou aos pássaros o que viu e ouviu

Migrantes de cenários fugidios 

Que se procuram

Quando outros já não servem para nidificar.

Lugares sem paz 

Que se obrigaram a abandonar. 


Desceu à cidade e a cantou também

Como ao brilho das luzes 

E à possibilidade de ser mais além…

Ali, onde tudo se ganha e se perde

Onde a ousadia se atreve.

Cantou o sol e a alegria

E todos os astros que o universo contém

A noite e o dia de mãos dadas

Na paz e na harmonia desejada. 


Cantou a alegria de ser irmão

E a exultação de poder dar de si 

E assim, sentir o calor de ser união.

Depois, chorou o medo e a dor

De já nada ser ou ter

E de se perder na tristeza do que se não faz

Por entardecer, por já não ser amor e paz. 


Chorou o acontecer da quimera  

Que não queria ser 

Mas que era, que era… 

Porém, não o sonho 

Nem o verde germinar da hera.


 
Chorou, rezou e cantou a si mesmo 

Em intermináveis horas de espera 

Até na dor encontrar

Os braços que lhe preparavam a festa. 

Eram fiéis e incansáveis 

Ternos e adoráveis.

 
E foi... 

Sabendo que, se possível

De novo regressaria aos mesmos abraços  

E ao leito de um calor e aroma

Que tão bem reconhecia. 


Cantou a partida que sabia certa

Com bilhete apenas de ida.

Por lá encontraria o amante sincero

A porta sempre aberta

A eterna melodia da sua despedida. 


Cantou e chorou a certeza 

Na chama do lume aceso.

Cantou e chorou todas as coisas 

E se reencontrou, por fim 

No canto de si mesmo.

Dulci Ferreira, a autora do poemaD

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