Penso ser a poesia o espelho onde nos revemos, e entendemos melhor o nosso avesso, pois os poemas parecem cruzetas em fim de dia, prontas a pendurar a pele num repouso necessário para limpar a alma.
Há poemas escritos no céu inspirando na Terra quem os sabe ler, sendo que a poesia e a lua são o sustento da noite, provocando a madrugada a adormecer nos braços do dia.
A vida para mim tem o significado da seiva, do fogo, da água. Em todas as premissas navega o princípio das coisas, o alimento do espírito. O foco da minha vida é ela própria, por isso
SOU!
Se a poesia é vida, nem sempre a vida é poesia.
Outrora
Via-te assim,
O cigarro entre os dedos
Os olhos fechados,
Falavas com os teus segredos,
Os outros que importam
O momento era teu,
Enquanto as vozes
Zurziam lá longe,
A música tocava
O teu corpo gritava,
Que importam os outros
Se o som era teu.
Tremiam-te as mãos
O copo nos lábios,
Bebendo ilusão
Falando mais alto
Que a tua razão
E eu não ouvia,
E eu não sabia,
Que enquanto voavas
As minhas asas tolhias,
Pairavas no fumo
Para lugar incerto.
Eu via-te assim,
Não te vejo agora,
Demora de outrora.
Maria Dulce Araujo, a autora do texto