Conta-se, que em tempos muito distantes, um pastor que vivia nas proximidades de Mangualde, teve o mesmo sonho três noites seguidas.
Uma voz segredava-lhe ao ouvido estas palavras:
- Vai até Santarém e procura um tesouro que os mouros esconderam na primeira ponte de pedra que lá encontrares!
O pastor pegou no seu alforge, tirou o burro da loja, despediu-se da mulher e pôs-se a caminho.
De vez em quando, perguntava a quem encontrava, se ia na direção certa para chegar a Santarém!
Os dias passaram e o homem fatigado, chegou ao seu destino. Uma ponte de pedra, bem perto de Santarém, parecia segredar-lhe as mesmas palavras dos sonhos e num impulso começou a procurar o tesouro.
Excitado, com a alegria que iria sentir quando o encontrasse, nem reparou que era a luz da lua que fazia da noite, dia!
Um dia passou, e outro e mais outro e de tesouro, nada!
Por ali vivia um almocreve que vendo tantos dias o pastor a olhar para todas as pedras da ponte, abeirou-se dele e perguntou:
- Perdoe a minha curiosidade, mas de onde veio, para onde vai e que algemas o amarram a este chão?
- Busco um tesouro que os mouros esconderam nesta ponte! Sonhei três noites seguidas com uma voz que me mandou cá procurar!
O almocreve não precisou ouvir mais nada!
Sem demoras, contou-lhe que se acreditasse em sonhos, teria ido a uma serra que nunca tinha ouvido falar, de nome Montemuro e ficaria muito rico, pois duas peças em ouro o esperavam junto a um amontoado de penedos.
O pastor que sabia da existência desta serra, não pensou duas vezes! Pegou na corda que prendia o burro, montou para cima do animal e regressou às origens.
Mal chegou a casa, meteu o burro na corte, disse à mulher que lhe arranjasse comida para levar e caminhou durante cinco dias até chegar ao Montemuro.
Percorreu os trilhos da serra e sempre que via um amontoado de penedos, observava-o cuidadosamente.
A serra parecia não ter fim e o pastor contemplava os verdes pastos que a cobriam. Nunca antes tinha visto tão apetitosas pastagens para o seu rebanho! À medida que descobria o Montemuro, debaixo de um sol abrasador, pensava no seu rebanho:
- Em pleno Verão, nunca vi tão bons pastos na minha vida! Verdes e tenros que mais parecem campos de alfaces! Aí se o meu gado aqui andasse!...
Certa noite, abrigou-se na gruta de uns penedos, no ponto mais alto da serra e adormeceu naquele lugar tão desconhecido do resto do mundo. Quando o sol lhe deu os bons dias, reparou num brilho muito intenso bem perto dele.
O maravilhoso, o impossível tinha acontecido!
Os mouros tinham ali escondido um cabrito e uma cabra em ouro!
-Estou rico, estou rico! - gritava para ninguém!
Sem caber em si de contente, voltou costas ao Talegre, assim se chama o ponto mais alto da serra do Montemuro e regressou à sua terra. Pelo caminho, dava voltas à cabeça, pois não sabia o que fazer com aquele tesouro. Resolveu, então, ir primeiro ter com o rei e oferecer-lhe uma das peças à escolha de sua majestade.
- Meu senhor e rei, tenho um presente que lhe quero oferecer!
Diga, quer o cabrito ou a cabra?
O rei pensando tratar-se de animais para comer, preferiu o cabrito pois era mais tenro.
Ao receber aquela misteriosa oferta, perguntou ao pastor:
- O que posso fazer por si, para lhe agradecer tão valioso objeto, bom homem?
Sem hesitar, o pastor olhou intensamente o rei e pediu:
- Meu senhor e rei, eu queria uma canada que levasse meu rebanho daqui até ao Montemuro! Lá, não faltam os pastos verdes e tenros e a serra é tão grande que dá para o meu gado e o gado de todos os pastores que vivem no sopé da serra da Estrela! O meu Senhor e Rei, sabe que nesta altura do ano, os rebanhos daqui não têm que comer, porque as colheitas ainda não foram feitas e as ovelhas e as cabras não podem entrar nos campos!
- Vá em paz, bom homem! Amanhã todos os meus subordinados irão abrir a canada daqui até ao Montemuro e os vossos rebanhos poderão ir para lá, todos os anos!
E, segundo esta lenda, a partir daquele ano, os rebanhos do sopé da Estrela passaram a transumar para o Montemuro!
Esta lenda, envolta na simplicidade, é uma herança cultural enraizada na alma de um passado que ficou longe, mas não se perde na memória dos pastores transumantes!
Celeste Almeida, a autora do texto