Sentada num banco de jardim, senti o sol aquecer-me as costas… como eu gosto destes dias de Outono.
A esta hora as crianças da escola estão prestes a sair e eu remanesço nos dias em que também eu saía da escola, desta mesma que foi onde dei a minha primeira aula quando cheguei a esta cidade.
De repente sinto-me invadida pelas sensações e sentimentos daquele dia… daqueles dias em que saía sempre com várias crianças agarradas às minhas saias, e como eu fui feliz.
Oiço o sino da escola e logo a seguir a cascata melodiosa das vozes de crianças irrompem a quietude da tarde e eu acordo do meu estado sonhador.
Não pelo barulho das crianças, mas pelo ligeiro toque no ombro.
Primeiro pareceu-me ser uma rabanada um pouco mais forte do vento que se começa a levantar… de novo o toque no ombro.
Então percebi, era ela.
Fecho os olhos e deixo que me fale.
Na verdade, estranhei o toque pois já há algum tempo que ela não me vinha falar ao ouvido. Com tanto “ruído” que tenho ouvido (e feito… confesso) percebo que não lhe tenho dado muitas oportunidades para me falar.
E numa solene gratidão escuto.
- Já que não tens todo tempo para me ouvir, tenho-te avivado os sentimentos… e então, não achas que os teus sentimentos tentam dizer-te alguma coisa…?
Ah, pois, é… pensavas que eu já tinha desistido de ti?! Pois deixa-te estar aqui, deixa que o sol de aqueça o corpo e eu te incendeie o pensamento.
E ali fiquei, serena, quieta.
- Ultimamente tens-te sentido dividida entre a pressão de te livrares das sombras e o teu fascínio pelo vazio, a dúvida. Fazes bem em pedir clareza, se for isso que necessitas, desde que não sucumbas ao niilismo, convencendo-te de que as tuas suspeitas são deveras a realidade. Tenho-te dado sonhos e cutucado a tua intuição par te ajudar a encontrares os “lugares seguros” que procuras…
Mas tu insistes, porque insistes em ouvir o ruído…
A este ponto, endireitei-me bem, o calor do sol causou-me um arrepio nas costas e senti que estava perto de levar um puxão de orelhas. Na verdade, daqueles que reconheço que até mereço.
- Escusas de te tentar disfarçar que não te toquei na ferida. E sabes bem que um puxão de orelhas de nada te valia agora. O que precisas de fazer é focar-te, agregar-te e reencontrares o caminho, por isso vou-te fazer um desafio.
Bem… assim não dá, desafios são comigo, relembro-me que me conhece bem demais e que jamais eu iria resistir a um desafio. Com um espírito curioso prontifico-me a escutar.
De sorriso que roça o matreiro continua:
- Esta semana o desafio é trabalhares e perceberes a diferença entre a imprudência e deliberação.
Que quando tomas decisões pelos outros sem os consultares, acabas sempre por te minares a ti mesma. Persegue antes as coisas que tu queres sem que te tornes gananciosa, pois não se pode ter tudo sempre e de uma vez só.
Bem…. Mais valia um puxão de orelhas!
Não me atrevo sequer a interromper, sem bem que será melhor para mim acabar de ouvir o que a Voz ainda, visivelmente, tem para me dizer.
- Filha, reorienta os teus relacionamentos, a tua criatividade e recursos materiais e não dês espaço à manipulação e controlo (sim… tanto da tua parte como dos outros!), pois é exatamente esses dois fatores que contribuem para relacionamentos desequilibrados!
Esta foi forte, pensei para mim. Respiro fundo e aceito o desafio, e mesmo quando eu penso que ela se vai despedir, vira-se de novo para mim e diz:
- Não te esqueças filha, O Universo é um carteiro eficiente. Nunca se engana na morada, nem demora na entrega.
Aconchega-me o rosto num sorriso que só ela tem….
E eu fico.
Com pena de não ter tirado apontamentos desta conversa, porque este a desafio não a quero desiludir.
Ventos Sábios
Ruth Colaço, a autora do texto