“Com que então, pensavas que eu te ia deixar estar nesse estado…! sinceramente!”
Assim do nada como se de um solavanco se tratasse, oiço estas palavras a ecoarem no peito.
Que susto!
Olhei à volta e nada vi….
Pois, claro! Era Ela, aquela Voz de novo, só podia ser!
Ainda ontem se fartou de me “desostinar” a cabeça, e hoje volta à carga…
Será que não há sossego nesta vida?! Qualquer dia mando-a para a reforma!
Sem paciência nenhuma dou comigo quase a refilar como menina mimada.
“O que é que foi agora? Não bastou o raspanete de ontem?”.
Engulo rapidamente a vergonha de ter respondido daquela maneira e sem dar sequer sinal de que sabia do que a Voz se estava a referir, virei-me para frente, estendi-me ao comprido na relva.
Barriga para o ar, mãos na nuca, contemplei o céu como se já estivesse de novo sozinha.
Silêncio…. “Será que se foi embora?” pensei.
De novo e sem dar conta mergulhei de novo naquele estado nostálgico de autocomiseração e indulgência ao qual, por vezes, gosto de me afundar. Esta coisa de ser poeta tem destas coisas, destes dias….
Bem dizia o meu pai que não há poetas felizes… deixei ir o pensamento agarrado a uma nuvem passageira.
Passageira como a nuvem dou por mim de novo a divagar, e agora já ia na canção que tanto gosto de cantar quando me abandono ao “dolce fare neinte” …
∞“…
Eu sou nuvem passageira…
que com o vento se va-a-ai…
eu sou como um cristal bonito,…
que se quebra quando cáááí…”
∞
Chega a ser irritante a forma como distraidamente canto essas palavras repetidamente… enfim!
“Ai cais, e quebras! Quebras, quebras!”
(Grrrrrrrrrrrrrrrrrr) sinto cá dentro, sem mostrar.
Resignada, ergo-me, sento-me à chinês e sabendo que vou ter que ouvir, ponho-me em posição de meditação… talvez custe menos e além do mais, quem por mim ali no parque passar não vai estranhar de me ver ali de novo….
“Armada em Monja!” dizem uns….
“Deixa a senhora Filho, ela está a falar com o céu”, dizem outros um pouco mais acordados.
“Coitadinhaaaaa….” Diz a Voz, entre um pequeno e agudo risinho, juntando ao tom um toque irónico!
“Uuuuuiiiii”, até senti um arrepio gelado embrulhar-me a nuca!
Não ia dar para escapar.
Enraizei, respirei fundo, preparei-me e pensei, enquanto acomodava melhor o traseiro na relva que a esta altura já me parecia estar colado ao solo, e pensei…
“Vá… venha de lá o recado, que eu cá já estou por tudo.”
“Deixa de ser autoindulgente!...
Agora que já conseguiste começar…
Atenção, só agora começaste!… a desapegar de pessoas e coisas que nada importam.
Enquanto isto te pareça ter sido difícil, permite-te sentir o alívio sem culpas.
Há sempre sabedoria por trás dos teus pensamentos e sentimentos. Tu sabes disso, e eu já não devia ter que te lembrar disso.”
Sinto um pequeno alívio e penso:
“Bem, não está a ser assim tão dura comigo hoje. Devo estar a fazer o meu trabalho minimamente bem.”
“Há escolhas que têm que ser feitas, filha.
Escolher entre a tua necessidade de uma profundidade espiritual e a superficialidade do mundo, por exemplo.
Tu nunca estás no teu melhor quando tentas culpar os outros pelas tuas escolhas, lacunas e limitações.
Desta vez conseguiste, decidiste contra tudo o contra todos, contra opiniões alheias.
Escutaste(-me) acabando por perceber que quando sentes o conhecimento submergido numa cave escura das águas tua mente, é aí!
É então que deves ser brava e forte, aperta o equipamento de mergulho, e vai à procura dele… sim, dele!
Do conhecimento…
Põe lá os príncipes encantados, os reis e valetes de lado agora…. Isto, a vida não é um jogo de cartas ou batota!
Quanto mais abrangente conseguires que o teu foco seja neste momento da tua vida, mais fácil te será ter atenção ao que realmente importa.
Ao simbolismo e sincronia do Universo à tua volta.
A direção em que o teu poder pessoal te leva e orienta depende apenas na tua capacidade de o reconheceres…
Sim, o teu poder, esquece os Joker´s e as cartas que a vida te atira…
Vês!?
Até me perco!
Onde é que eu ia…?”
Reviro os olhos e sussurro, “o meu poder pessoal…?
Ias aí quando paraste”
“Pois… tens razão.
A direção em que o teu poder pessoal te leva e orienta depende apenas na tua capacidade de o reconheceres e controlares.
Simples. Simples assim.”
Assoberbada com tanta clareza, fico… respiro… Uma brisa fez-me sentir sozinha de novo.
Sozinha…
Mas acordada, empoderada.
Tinha encontrado o mapa para os próximos dias.
IN:
Conversas com a Voz
Ventos Sábios
Ruth Colaço, a autora do texto