Como teria começado a transumância da Estrela para o Montemuro? A origem desta "viagem" é uma montanha de incertezas, mas como o mundo lendário sempre me fascinou, apaixonada fiquei pela lenda que "justifica" o começo desta cultura pastoril.

Certo dia, um homem dos lados de Mangualde, cansado que estava da vida pobre que levava, decidiu ir ao encontro de um sonho que viveu toda a noite no seu sono. Uma voz repetiu-lhe imensas vezes, que fosse até Santarém, que procurasse bem junto de uma ponte, que lá iria encontrar sua salvação.
A distância era muita, mas como a ambição era ainda maior, deitou-se a caminho montado num burrito, pois outros transportes não havia.
Depois de imensas horas de viagem, à sua frente viu a ponte do sonho. Sentou-se numa pedra durante todo o dia, mas nada encontrou, nem nada viu, a não ser pessoas que iam e vinham.
A noite chegou e o pobre homem preparava-se para regressar à sua terra, quando um vulto se aproxima. Era um outro homem. Conversa puxa conversa e a pergunta chave surgiu:
- Mas, o que faz aqui a esta hora tão tardia?
- Olhe, vim atrás do meu sonho que me disse que aqui, neste lugar, encontraria o meu bem!...
- Ó bom homem, então o senhor vem de tão longe por causa de um sonho? Tivesse feito como eu que não liguei a um sonho que tive já lá vão alguns anos!
- E que sonho foi esse, se é que posso saber?
- Dormia eu na paz dos anjos, e uma voz falou-me que fosse até à Serra do Montemuro que num sítio chamado Assim e Tal e num penedo chamado Assim, Assim, eu encontraria uma fortuna deixada lá pelos Mouros. Claro que não fui a uma serra que nunca tinha ouvido falar!
Aquela conversa deixou o homem dos lados de Mangualde com uma pulga atrás da orelha, uma pulga que lhe picava dia e noite!
- Mas, porque razão aquele homem me falou na Serra do Montemuro? Que herança será essa que os Mouros esconderam lá nos penedos?
O raio da pulga não parava de o picar, dia e noite. Era a força que o empurrava para a Serra do Montemuro. Inquieto, ansioso e acreditando que iria pôr as mãos nesse tesouro, informa-se da localização do Montemuro e deita-se a caminho.
Era o mês de junho, véspera de S. João o santo popular. A serra estava cheinha de erva, de comida de pastagem para o gado. Andou. andou, olhava com atenção todos os penedos e...numa enorme laje encontra uma cabra e um cabrito de ouro. Sem saber o destino que lhes havia de dar, decidiu ir oferecer uma peça ao rei.
- Saiba vossa majestade que trago um presente para si. Escolha o que quiser. Ou uma cabra, ou um cabrito.
O rei, sabendo que a cabra seria muito mais dura, preferiu o cabrito pois iria poder degustá-lo na Corte. Vendo tratar de de uma peça em ouro, de imediato se arrependeu...mas, já não podia voltar atrás! Agradeceu ao homem e perguntou-lhe o que queria em troca.
- Saiba vossa majestade, que meu desejo era ter uma canada desde a minha terra, até à Serra do Montemuro para levar as ovelhas e as cabras até lá! Nunca vi uma serra com tão apetecível pasto como aquela!
Diz a lenda, que o rei mandou fazer de imediato uma canada que passou a ser o caminho dos pastores e rebanhos das fraldas da Serra da Estrela, que todos os anos "viajavam" até ao Montemuro.

